domingo, 27 de janeiro de 2008

09 - ESPETACULARIZAÇÃO

Desde que os políticos romanos entenderam que é necessário dar “pão e circo” às classes menos aquinhoadas da sociedade, como forma de deixá-las inebriadas e distantes de qualquer forma de entendimento consciente, o que se vê hoje no carnaval campista é a manipulação dessa arte popular como forma de propaganda política.
Mas, assinale-se que as sociedades são culpadas, pois na busca por apoio financeiro suficiente para fazer o carnaval acabam abrindo espaços para o puxa-saquismo. E essa busca de verbas acabou virando um negócio, já que a prefeitura, segundo eles, não lhes dá subsídios suficientes para cobrir os custos do espetáculo.
Curiosamente, o artigo “Folia camuflada: o samba-enredo como cabo eleitoral”, de Bruna Panzarini e Marília Antonelli
[1], publicado no Anuário UNESCO/UMESP, (p. 187) demonstra que a prática exageradamente verificada no carnaval campista não é única e que, possivelmente, pelo interior desse país de dimensões continentais esteja acontecendo a mesma coisa. O exemplo do interior de São Paulo mostra que esta situação se repete praticamente no carnaval brasileiro.
Dessa maneira, entende-se que existe a necessidade do dinheiro para que as agremiações pudessem/possam colocar na avenida seus carnavais. Mas essas pessoas não conseguiam enxergar o fato de que esses padrinhos “monetários” também passavam a utilizar a moeda como uma mercadoria de troca.
Para DEBORD (1997, p. 34), “o espetáculo é a outra face do dinheiro: o equivalente geral abstrato de todas as mercadorias”. E continua dizendo também que “o dinheiro dominou a sociedade como representação da equivalência geral, isto é, do caráter intercambiável dos bens múltiplos, cujo uso permanecia incomparável”.
DEBORD (op. cit., p. 31) mostra, também, que na fase primitiva da acumulação capitalista “a economia política só vê no proletário o operário”, que deve receber o mínimo indispensável para conservar sua força de trabalho; jamais o considera “em seus lazeres, em sua humanidade”. Esse ponto de vista da classe dominante se inverte assim que o grau de abundância atingido na produção das mercadorias exige uma colaboração a mais por parte do operário”.
Se o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas mediadas por imagens, pode-se afirmar que o carnaval é o reflexo de uma relação lúdica, festiva e que da forma em que é feita, envolvendo interesses políticos, cria uma cumplicidade entre os homenageados e as sociedades carnavalescas. O autor (p.15), esclarece o assunto, da seguinte forma:

Não é possível fazer uma oposição abstrata entre o espetáculo e a atividade social efetiva: esse desdobramento também é desdobrado. O espetáculo que inverte o real é efetivamente um produto. Ao mesmo tempo, a realidade vivida é materialmente invadida pela contemplação do espetáculo e retoma em si a ordem espetacular à qual adere de forma positiva. A realidade objetiva está presente dos dois lados. Assim, estabelecida cada noção só se fundamenta em sua passagem para o posto: a realidade surge no espetáculo, e o espetáculo é real.Essa alienação recíproca é a essência e a base da sociedade existente (...).

O carnaval é uma grande ópera popular e poderia ser mais interessante se desenvolvesse enredo de natureza pedagógica, como o sentido de oferecer à população informações mais precisas sobre temas históricos (origem de todas as escolas de samba). Como espetáculo, fica mais frágil na medida em que os temas passaram a adotar temáticas políticas em troca de esquemas financeiros que lhes garanta os recursos necessários para a grande apresentação carnavalesca.
Para a população, pouco importa o tema, se determinada agremiação escolhe um político para homenagear. O importante é (repete-se) o espetáculo. No fundo, o marketing feito somente durante o carnaval, desfaz-se como bolha de sabão. O pior é que os beneficiados vão, a qualquer hora, que os investimentos não são compensatórios e que, tese, melhor é direcionar suas campanhas para outras instâncias da comunicação.
[1] PANZARINI, Bruna; ANTONELLI, Marília, “Folia camuflada: o samba-enredo como cabo eleitoral”, São Paulo: Anuário UNESCO/UMESP, 1977.

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